segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Era Carolina, a moça triste?
Era Gabriela?
Era bela.
Era lua, estrela?
Era uma menina
do anel?
Era aquela.
Era Eva? Amélia?
Ismália?
A delicada.
Era a que cala ou fala?
Era fábula?
Era Lídia? Lia?
Cecília?
Na mobília de nuvens
Astro no céu?
Nas urbes
Era poetisa? Poesia?
Era psiu? Um sussurro?
Era A? Era B?
Era ou é?
Era ela.

domingo, 20 de janeiro de 2013

O átomo
o átomo pequeno, invisível
(insondável)
Ele é o detalhe
que (enquanto se despreza
o atrito
a luz
o ambiente
tudo quanto é instável)
importa essencialmente.

Não está aí a diferença
entre o supérfluo detalhe
e o detalhe necessário?

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A ratoeira

Quando os ratos nascem
pelados e brancos
já há um lugar reservado pra cada um

dentro da ratoeira.

Desde pequenos são educados pra um dia
chegarem lá. Na universidade
se preparam pra serem os primeiros
e melhores no ofício
de entrar na ratoeira.
(Mas a ratoeira é democrática: pobres, feios, ignorantes
ela aceita a todos;
e também ricos, bonitos e doutores)

É a ratoeira que rói o rato.
Sem ela não se come
(ela, que come com gula)
Sem ela não se vive
(ela, que serve pra matá-los)
Ela é toda a razão do rato existir.

domingo, 13 de janeiro de 2013

Abandonar toda a estética
Mandar para o inferno a métrica e as rimas
As linhas cirúrgicas
As composições complexas
Para o poço a sofisticação narrativa
O vocabulário rebuscado
As notas hábeis e virtuosas
Deixar no lamaçal as frases de efeito
O teor filosófico
A construção planejada
As cores harmônicas
Para o inferno com os ritmos cadenciados!
Para o inferno com a beleza das melodias!
Para o inferno!
Jogar no abismo qualquer expressividade.

Quem precisa de arte

quando ama?

sábado, 12 de janeiro de 2013

A mesa


A cena se inicia com a mãe e seus filhos na sala, sentados num largo círculo sem nada no meio. Eles se movimentam em silêncio como se estivessem comendo em volta de uma mesa, mas não há nada. 

FILHA: Sabia mãe, que seu filho andou roubando de novo?

A mãe fica calada.

FILHO 2 com ironia: Normal.

O filho 1 que roubou se levanta.

FILHO 2: Onde é que você vai?!

FILHO 1: Vou roubar. Tô precisando de dinheiro pra fumar.

Ele sai. Os outros continuam a comer em silêncio.

FILHO 2: Eu tô desempregado, mãe.

FILHA: Normal...

FILHO 2: Eu tô falando é com a mãe, sua... garota de programa!

FILHA: Do que você me chamou?!

FILHO 2: Exatamente o que você ouviu! Você pensa que a gente não sabe, é?

FILHA: Quer saber?! Eu sou mesmo! Sou mesmo! Sou uma puta! E você não tem nada com isso! Muito melhor do que viver às custas da mãe.

Ele dá um tapa na cara dela. A mãe observa, indiferente.

FILHA: Cê me paga!

Sai, nervosa.

Entra o filho 1, completamente perturbado.

FILHO 1: Mãe, eu juro que não queria! Foi um acidente... um acidente!

FILHO 2: Mas do que é que você está falando?!

FILHO 1: Foi sem querer, mãe. Eu, eu matei uma pessoa. Mas eu juro que não queria! Juro! Quando vi já tinha acontecido.

Ele se senta, calado.

FILHO 2: Só faltava essa... uma mulher da vida e agora um drogado assassino.

Todos se calam novamente, ainda comendo.

Chega a filha, com as roupas rasgadas e e machucada.

FILHO 2: Hah!

FILHA: Mãe, eu juro que não volto mais pra lá!

FILHO 2: Levou mais tapa na cara!

FILHA: Cala a boca!

FILHO 2: Aposto que estava escondendo dinheiro do cafetão.

FILHA: Cala a boca! Eu não quero ver aquele cara nunca mais.

Ela se deixa sentar numa cadeira, chorando.

Todos comem em silêncio como no início.

MÃE: Será que comeremos pra sempre numa mesa invisível?

***

Escrevi essa peça pra apresentar na aula de geografia.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O RATO

Não pedia, pois não era mendigo,
Mas chegava de noite, faminto,
E vasculhava toda a minha casa.
Comia e mais nada levava consigo.

Cozinha, panelas, o lixo e as sobras,
Devorava tudo como quem devora
Um banquete que não existe igual.
Na madrugada, farto, ia embora.

Estranho ladrão que não roubava
Mas sempre voltava na noite seguinte
Pra saciar a fome em minhas migalhas.

E eu o via dentro da noite insone
Apesar de fazer que não o visse
Pra deixar que ele matasse a  fome.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O poema       não
vale a pena.
A vida          não
vale a rima.
(No entanto se escreve e se vive mais que se escreve)
Algema alguma
acima.