I
Uma velha negra no ônibus estava sentada e em pé ao seu lado um homem de camisa verde. O sol batia na camisa do homem e refletia no rosto da velha que se iluminava do verde. E isso era experiência estética. Não experiência para eles que a viviam, mas para mim, que via tudo. A experiência estética só existe se não me insiro nela, quer dizer, se não é propriamente experiência. Se participo já não tenho a consciência da experiência e sem consciência não há estética. A arte é um lampejo de auto-consciência da experiência humana, é quando se sai da vida por um instante para vê-la de fora. E é apenas essa consciência que diferencia a arte de qualquer outra atividade. Tudo é potencialmente artístico, mas apenas se concretiza como arte quando há essa consciência.
II
Quando se fala em arte não é em arte que se fala. A arte é necessária o suficiente para ser esquecida, para ficar subentendida como algo do qual não se fala por que é natural que esteja ali. A arte é simples o suficiente para ser feita por qualquer um, por qualquer criança ou adulto e com qualquer coisa. Quando se fala em arte se está falando em política, em metafísica, em ideologia, em relações humanas. Se está falando principalmente de si próprio. Quando se critica a arte na galeria não é a arte que está sendo criticada, mas o fato de ela estar ali, a ação que a levou para lá, a situação política que permite isso, a predileção de uma arte em detrimento de outra, a condição que permite que se reconheça um e não se reconheça outro. Quando se vende arte não é a arte que é vendida, é sua função — ou a arte continua intacta mesmo depois de vendida ou se converte em pura função, deixando de ser arte.